Nas ondas da Internet
Uma das mídias que tem pouco espaço na própria mídia é o rádio. Diferente de sua prima rica, a televisão, cujos bastidores têm cobertura maciça de jornais e sites de Internet. Porém, há mais de dois anos um blog vem tentando satisfazer as necessidades dos rádio-amantes. O Rádio Base começou modestamente como um blog e hoje é o mais importante portal independente dedicado ao assunto.
A estrutura do Rádio Base é simples: há um guia de links para emissoras de rádio de todo o país; textos de fôlego escritos por jornalistas e radialistas sobre o veículo; arquivos de som com trechos de programas históricos de rádio; além disso tudo, há também um programa de rádio experimental, o Rota 77 com o melhor do punk rock no Brasil e no mundo.
Mas o sustentáculo do portal é o blog no qual a dupla Marcos Lauro e Marcos Ribeiro, o primeiro radialista e o outro jornalista, postam notícias e análises sobre o rádio. Tudo começou quando Ribeiro conversava com um colega sobre a Internet. “Ele disse que, se soubesse como se fazia páginas na Internet, faria uma só sobre cachaça. E sugeriu que fizesse uma sobre rádio, já que eu gostava tanto do assunto. Comecei a fuçar e descobri que poderia montar uma no Terra à Vista, de Portugal.” Dessa forma ele fez o Rádio Gagá, um embrião do que seria o Rádio Base. “Dois anos depois, descobri um tal de blog, que o pessoal usava para escrever, e que saía na hora na Internet. Chamei o Marcos Lauro e ele topou fazer”, completa.
A iniciativa de Marcos Ribeiro em usar a ferramenta para falar de rádio foi pioneira. “Perguntei à Cora Ronai, do Globo, que entendia tudo de Internet, se tinha mais algum blog de rádio. Ela pesquisou de tudo que foi jeito e depois me mandou a resposta dizendo que éramos os primeiros a fazer um blog assim, pelo menos no Brasil.”
O Rádio Base atua de forma independente. Os dois Marcos o tocam pelo simples prazer, sem ganhar dinheiro com isso. Mas isso é algo que não preocupa Ribeiro. Quando perguntado se ele pensa em profissionalizar o portal, fez até uma brincadeira com este repórter: “Quero sim. Você não quer ser meu diretor comercial? Estou precisando de um cara que entenda do riscado. Eu só sei escrever. Se você conseguir um anunciante legal, te dou até 20%. Topa?”
Uma das características mais marcantes do Rádio Base é a interatividade com os leitores, transformando dessa forma o blog num espaço importante para a discussão sobre a qualidade do rádio. O LABORATÓRIO POP aproveitou para saber um pouco mais de Marcos Ribeiro sobre o panorama atual das nossas FMs musicais atualmente. Uma de suas principais críticas é quanto ao excesso de rádios clandestinas no ar. “Hoje em dia tem muita rádio pirata enchendo o saco, quando você quer ouvir uma rádio comercial de potência menor. Antigamente, no tempo da ditadura, soava até heróico essa transgressão radiofônica ao poder militar. Hoje em dia, pirataria é uma coisa ridícula, quando a gente pensa que qualquer pessoa pode fazer rádio pela Internet sem encher o saco de ninguém com indesejáveis interferências. Isso se lembrarmos que uma rádio ilegal corre o sério risco de não ser ouvida nem pelos seus vizinhos da rua de baixo”, diz.
Marcos Ribeiro não deixa de apontar uma alternativa a quem deseja colocar sua emissora no ar. “Na Internet, pelo menos, algum conhecido seu que more em outra cidade distante pode ouvir sua programação, nem que seja para dar uma força”, afirma.
Com relação à programação musical, a principal crítica que se faz é à repetição daquilo que é veiculado nas rádios voltadas para o público jovem. Sempre os mesmos artistas, com as mesmas músicas. A culpa seria do ouvinte, que é conservador demais e gosta de ouvir aquilo que já conhece, ou dos programadores que ousam pouco? “Depende do segmento. As rádios de rock e de pop têm um pessoal muito medroso (eu ia dizer bundão, mas é feio, né?). Quando é uma rádio de audiência certa, como a Jovem Pan, Mix, 89, é até compreensível que eles não queiram trocar o certo pelo duvidoso”, responde.
O estranhamento de Marcos Ribeiro é com emissoras que estão em posições intermediárias do ranking de audiência, e mesmo assim, insistem em copiar fórmulas bem-sucedidas, em vez de trilhar caminhos alternativos. Ele dá um exemplo que acontece em São Paulo “O que eu não entendo são emissoras como a Metropolitana – que está arrastando a cachorra - insistir num modelo que tá na cara que não vai funcionar nem comendo muito jabá. Se fosse diretor desta rádio, botava pra foder. Metia no playlist bandas novas, desconhecidas, que só tem demo tape feito em casa, ou em alguma gravadora minúscula. Se iria dar certo, só Deus sabe. Entretanto, se desse errado, pelo menos teria valido a tentativa de acertar. O que não dá é para ficar sendo uma cópia mal feita da Jovem Pan”, afirma.
Pela descrição feita por Marcos Ribeiro, impossível não lembrar da Fluminense FM, do Rio de Janeiro, que justamente abriu sua programação para a veiculação de fitas-demo de bandas importantes que escreveram a história do rock brasileiro dos anos 80. Ele acha que existe espaço para uma emissora desse tipo. No entanto, faz uma única ressalva “O problema é colocar gente no departamento comercial com disposição suficiente para 'vender' o conceito de rádio como essa para o mercado publicitário”, diz.
Existe no meio rádio uma palavra que causa muita polêmica chamada jabaculê. Ela designa a prática das gravadoras em pagar para que o trabalho de um determinado artista entre em alta rotação na lista de uma emissora. “Não sou contra o jabá. Depende da forma como é praticado. Ele pode até ser um bom incentivo para o artista, mas também pode ser excludente e fatal”, diz. Marcos Ribeiro, porém, considera que a questão do jabá não se limita apenas ao rádio "Creio que o grande equívoco é tratar o jabaculê como um fenômeno só radiofônico. E não o é. Na televisão, pelo que se comenta, tem muitojabá. No jornalismo impresso também. Jabaculê não é ilegal. Estão tentando torná-lo um crime, mas isso é demagogia", afirma. Ele vai mais longe e acha que o próprio ouvinte não se importa muito com essa questão: “Mais de 80% dos ouvintes nunca ligou se na rádio que eles ouvem tem ou não carne seca na parada. O ouvinte quer a música que ele gosta - ou acha que gosta”, diz.
Sobra uma crítica de Marcos aos radialistas que, segundo ele, por medo de represálias ou por falta de coragem, juram que nunca participaram de esquemas de jabá. “Os únicos que admitiram isso até hoje foram o André Midani e Tutinha, da Jovem Pan. O restante diz que não faz ou porque quer passar por ‘bom moço’, ou porque nem vê a cor da bufunfa”, diz.